Trabalhadores submetidos a jornadas excessivas para atingir elevadas
metas e obrigados a registrar boletins de ocorrência dos furtos de
energia por eles constatados, utilização de registro fraudulento de
ponto e não concessão de intervalos para refeição ou descanso: são
algumas das irregularidades que resultaram na condenação da Companhia
Energética do Rio Grande do Norte (Cosern) por violação sistemática da
legislação trabalhista, em relação aos empregados da área de manutenção,
atendimento e fiscalização de fraudes da rede elétrica no estado. A
condenação decorre de recurso do Ministério Público do Trabalho (MPT/RN)
junto ao Tribunal Regional do Trabalho (TRT), em processo movido contra
a empresa por desrespeito à jornada e às normas de saúde e segurança do
trabalho. Conforme a decisão da 1ª Turma do TRT, a Cosern terá que
pagar multa de R$ 5 mil por empregado que deixar de enquadrar nas
determinações. O MPT/RN recorreu ao Tribunal Superior do Trabalho para
que a empresa seja condenada, ainda, a pagar indenização por dano moral
coletivo, no valor de quase R$ 10 milhões.
De acordo com a Ação Civil Pública nº 111200-32-2010-5-21.0008,
ajuizada pelo MPT/RN, foram constatadas: a ausência de registro efetivo
da jornada de trabalho, manipulação dos horários e não pagamento de
horas extras; extrapolação recorrente do limite de duas horas
extraordinárias diárias, sem justificativa legal, em atividades de
risco; não concessão de intervalo mínimo dentro de uma mesma jornada e
entre duas jornadas; condições de trabalho inseguras e prejudiciais à
saúde e à segurança dos empregados que fiscalizam as fraudes de energia
nas instalações prediais.
Além disso, foi verificado que os fiscais de fraude trabalham em
situações de stress, com risco de agressão dos usuários que estão sendo
fiscalizados, uma vez que atuam desacompanhados. A ação revela, ainda,
que os empregados do setor exercem jornada de trabalho extenuantes, de
até 18 horas em um só dia, sem os devidos repousos e intervalos, em
determinados casos chegando a mais de 190 horas extras durante o mês,
com pressão patronal para o alcance de metas diárias de produção (6
atendimentos, quando a média é de 4,5 por dia). “Tais condições de
trabalho são indignas e inaceitáveis, com evidentes prejuízos físicos e
psíquicos para os trabalhadores, expostos a graves riscos de acidentes
(como choques elétricos) e adoecimento”, ressalta o procurador regional
do Trabalho Xisto Tiago de Medeiros Neto, que assina a ação.
Antes de mover o processo, o MPT/RN propôs à Cosern a assinatura de um
termo de ajustamento de conduta, mas a empresa recusou-se a firmar o
TAC. Para demonstrar as condutas apontadas, a ação teve como base três
relatórios de fiscalizações da Superintendência Regional do Ministério
do Trabalho e Emprego, realizadas em períodos distintos, além de 12
autos de infração registrados em tais ocasiões. “A documentação revela
grave quadro de irregularidades praticadas pela Cosern em detrimento da
saúde e segurança dos empregados, comprovando flagrante, abusiva e
continuada violação de normas básicas e irrecusáveis de proteção aos
trabalhadores,” destaca o procurador regional do Trabalho.
A decisão de segunda instância reconheceu os argumentos apresentados
pelo MPT/RN e rejeitou a alegação da defesa de que é irrisório o número
de casos de violações, “até porque um único caso não é justificável
apenas por esse argumento,” esclarece a desembargadora trabalhista Maria
de Lourdes Alves Leite, que assina o voto aprovado pela maioria da 1ª
Turma do TRT. “Ademais, o procedimento de fiscalização é realizado por
amostragem, e a identificação de trabalhadores serve para demonstração
concreta dos fatos verificados durante atuação fiscal,” conclui.
Também foi reconhecida a acusação de que os empregados tinham que
registrar boletim de ocorrência em nome próprio, bem como prestar
depoimento e comparecer às audiências decorrentes dos furtos de energia
verificados na fiscalização, sem sequer acompanhamento de advogado da
empresa. Ficou comprovado, ainda, que o atual sistema de controle de
horário propicia a manipulação dos dados da jornada de trabalho dos
empregados, tendo por efeito a sonegação do pagamento das horas
extraordinárias, cujo verdadeiro registro termina por ser ocultado.
Diante das irregularidades demonstradas, o TRT/RN determinou à Cosern
uma série de medidas a serem adotadas para garantir o controle de
jornada e os devidos repousos, em conformidade com a legislação
trabalhista, além de fixar a obrigação de não exigir, nem permitir, que
os empregados compareçam a Delegacias de Polícia e a audiências
judiciais desacompanhados de advogado da empresa, ainda que não
trabalhem mais para a Cosern. Segundo o TRT/RN, a Cosern também deve
realizar, a cada seis meses, avaliação física e psicológica dos
empregados do setor de fiscalização de fraudes, e assegurar que os
serviços de fiscalização sejam efetuados por pelo menos dois empregados,
a fim de diminuir os riscos de agressão constatados.
Eventual descumprimento constatado pode ser denunciado aqui, inclusive de forma anônima.
Dano moral coletivo
Apesar de a decisão de segunda instância ter reconhecido os fatos
demonstrados pelo MPT/RN como um desrespeito aos direitos de uma
coletividade de trabalhadores, o pedido de indenização por dano moral
coletivo não foi acatado pela Corte Regional. Dessa forma, o MPT/RN
ingressou com recurso junto ao TST com a finalidade de reformar a
decisão neste ponto, objetivando a condenação da Cosern ao pagamento do
dano causado à coletividade, estimado em R$ 9.860.000,00.
Assessoria de Comunicação Ministério Público do Trabalho no RN
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