O juiz federal Walter Nunes da Silva Júnior, titular da 2ª Vara
Federal no Rio Grande do Norte, condenou os envolvidos na operação
“Pecado Capital”, que investigou fraudes e desvios no Instituto de Pesos
e Medidas do Estado (IMPE-RN), a prisão, serviços comunitários e
multas. O pivô do escândalo, Rychardson Macedo, foi condenado a 44 anos
de prisão, mas teve a pena reduzida em 39 anos após entregar o deputado
estadual Gilson Moura e o filho da ex-governadora Wilma de Faria, Lauro
Maia, como chefes do esquema e beneficiários dos recursos desviados via
corrupção no órgão. Estima-se que tenham sido desviados pelo esquema
cerca de R$ 4,4 milhões dos cofres do estado – estimativa com base nas
multas aplicada pela Justiça Federal.
Segundo a decisão do juiz Walter Nunes da Silva Júnior, publicada
nesta quarta-feira 12, “o resultado financeiro de boa parte dos recursos
financeiros desviados do IPEM/RN era dividido, em quatro partes
iguais”, sendo elas apontadas na delação premiada por Rychardson. “O
depoimento de Rychardson de Macedo, no que é corroborado, em alguns
pontos, pelos que foram prestados pelos demais colaboradores, revela que
o esquema ilícito foi engendrado por quatro pessoas, que, segundo ele,
formavam o topo da pirâmide: Ele, Rychardson de Macedo, o deputado
estadual Gilson Moura, o advogado Fernando Caldas, e o também advogado e
ex-candidato a deputado estadual Lauro Maia, filho da governadora do
Estado à época, Wilma de Faria. Agregou que o resultado financeiro de
boa parte dos recursos financeiros desviados do IPEM/RN era dividido, em
quatro partes iguais, ou seja, entre as pessoas em referência”, diz o
juiz Walter Nunes da Silva Júnior, em sua decisão.
Na distribuição de espaços do governo Wilma de Faria (2003 a 2006 e
de 2007 a 2010) à base aliada, coube a Gilson Moura o IPEM no chamado
sistema de “porteira fechada”, no qual o beneficiário, ou seja, o
deputado Gilson Moura, a indicação de todos os cargos, desde o
diretor-presidente, para o qual indicou seu então homem de confiança,
Rychardson Macedo, bem como os demais cargos de relevância do órgão,
cuja missão institucional deveria ser “proteger o consumidor e garantir a
competitividade entre as empresas, nos campos da Metrologia Legal da
Qualidade, no estado do Rio Grande do Norte”.
O MP acusou Rychardson de Macedo, seu irmão, Rhandson de Macedo, os
pais deles, José Bernardo e Maria das Graças – ambos receberam o perdão
judicial, que constatou que foram usados pelos filhos – além de Adriano
Nogueira, Daniel Vale Bezerra, Aécio Aluízio Fernandes de Faria, Acácio
Fortes e Jeferson Witame Gomes por crimes de formação de quadrilha e de
lavagem de dinheiro, crimes contra a administração pública, peculato e
corrupção passiva, dentre outros. Jeferson Witame Gomes foi absolvido
das acusações.
DELAÇÃO
Rychardson foi condenado a 44 anos de cadeia, mas, devido à delação
premiada, na qual entregou os líderes da quadrilha, o juiz Walter Nunes
aplicou pena definitiva de 5 anos, 10 meses e 6 dias de reclusão a ser
cumprida, inicialmente, no regime semiaberto, em “estabelecimento
penitenciário localizado fora deste Estado”, como parte do acordo da
colaboração premiada.
A delação de Rychardson foi tão significativa no processo que
resultou na diminuição da pena de prisão em mais de 39 anos, assim como
também reduziu a pena de multa em quase R$ 400 mil. Além de Richardson,
todos os demais – à exceção de Acácio – também optaram pelo benefício da
delação premiada, tendo suas penas reduzidas pela Justiça. Sem a
delação, a maior parte das penas ultrapassaria a casa dos 10 anos ou
mais de prisão. Com a delação, elas caíram para 8 anos, 5 anos, 3 anos,
ou mesmo meses.
O irmão de Rychardson, Rhandson, pegou 3 anos e 2 meses de reclusão, a
ser cumprida, inicialmente, no regime semiaberto, em estabelecimento
prisional a ser definido pelo juiz da execução. Entre os demais
condenados, Adriano Nogueira foi condenado a 3 anos, 10 meses e 28 dias
de reclusão; Aécio Faria ficou em 5 anos, 10 meses e 17 dias; Daniel
Vale 6 meses e 2 dias de reclusão; Acácio Fortes 8 anos, 7 meses e 10
dias. Aos pais de Rychardson e Rhandson, José Bernardo e Maria das
Graças, o juiz concedeu o perdão.
Além das condenações à prisão, merece destaque as multas aplicadas
pela Justiça. Rychardson foi multado em R$ 1.161.525,00, porém, com a
redução de 2/3 da delação premiada, o juiz arbitrou o valor da pena de
multa em R$ 774.350,00. Rhandson foi multado em R$ 591.600,00, contudo,
diante da redução de 2/3 da delação premiada, fixou-se o valor em R$
394.400,00. Adriano R$ 183.600,00, com redução, passou-se para R$
111.600,00. Aécio R$ 682.387,50; com a diminuição passou-se para R$
122.400,00. Acácio não teve redução, tendo que arcar com multa de R$
1.874.250,00.
Wilma trocou cargo no IPEM por apoio de Gilson ao seu governo
A delação premiada permitiu, na visão do juiz Walter Nunes, desnudar o
“viés eleitoreiro” do esquema de corrupção no IPEM. Para o magistrado,
restou comprovado que o cargo de diretor-geral do IPEM foi oferecido ao
deputado Gilson Moura como “recompensa” pela sua adesão à base
parlamentar da gestão Wilma de Faria.
“O viés eleitoreiro do esquema é desnudado em todos os depoimentos
colhidos, restando claro que o cargo de diretor-geral foi oferecido ao
deputado estadual Gilson Moura, como recompensa pela sua adesão à base
parlamentar da gestão da então governadora Wilma de Faria. O deputado
estadual Gilson Moura indicou para o cargo Rychardson de Macedo, seu
colaborador já de algum tempo, com a missão de operar um esquema que
serviria para captar recursos para o financiamento de campanha
política”, afirma o magistrado na sentença.
As revelações de Rychardson, segundo Walter Nunes, “são
contundentes”, quanto à participação do deputado estadual Gilson Moura
no que o magistrado denomina de “plano criminoso”. Na sua sentença,
Nunes afirma que o depoimento do pivô do esquema revelou que os serviços
e valores do IPEM “foram utilizados para fins eleitorais, prestando-se
os recursos desviados para irrigar campanha política, mediante a
constituição do que se convencionou chamar, em nosso meio, de caixa 2
(dois)”.
Jeferson Witame é único absolvido no processo da “Pecado Capital”
O empresário Jeferson Witame Gomes, proprietário dos restaurantes
Piazzale, foi absolvido pelo juiz Walter Nunes da Silva Júnior, da 2ª
Vara Federal, da acusação de lavagem de dinheiro, proferida pelo
Ministério Público Estadual, dentro das investigações da Operação Pecado
Capital. Dentre todos os indiciados no processo, Witame foi o único
sobre quem não recaiu nenhuma condenação. O magistrado classificou de
“ilações” os elementos apontados pelo MP contra o empresário, destacando
que não foram apresentadas provas da suposta participação de Witame nas
irregularidades investigadas. Prevaleceu, assim, a tese da defesa de
Jeferson Witame Gomes, representada pelos advogados Rossana Fonseca e
Mateus Pereira.
De acordo com os advogados, o juiz Walter Nunes Júnior considerou que
não ficou comprovada a intenção do empresário de cometer nenhum ato
delituoso ao se associar ao advogado Rychardson de Macedo Bernardo na
abertura de uma unidade do restaurante no shopping Midway Mall. Os
advogados Rossana Fonseca e Mateus Pereira destacam que seu cliente não
tinha conhecimento da origem dos recursos apresentados por Rychardson
Macedo para formalizar a sociedade no estabelecimento.
Esta linha de defesa foi entendida como procedente pelo juiz. “A
circunstância de um dos sócios ter se valido do empreendimento para
promover a lavagem de capitais, por si só, não tem o condão de conduzir,
por inferência, à conclusão de que o outro integrante do grupo
societário agiu, igualmente, com dolo. É indispensável, para fins de
incriminação de todos os sócios, que seja revelado, com prova concreta,
que todos tinham conhecimento da origem ilícita dos recursos e atuaram
com o propósito de providenciar a lavagem”, observa Walter Nunes Júnior,
em sua sentença.
Após analisar todos os documentos e depoimentos tomados durante a
fase de instrução do processo, o juiz interpretou que o “objetivo
primordial” de Jeferson Witame era “explorar a atividade comercial de
modo lícito e regular e não entrar e fazer parte do esquema de fraudes e
de lavagem de dinheiro comandado pelo denunciado Rychardson de Macedo
Bernardo”.
“Gilson, você é um pilantra e picareta; nunca mais dirija a palavra a mim”
Interceptações telefônicas feitas com autorização judicial mostram a
deterioração da relação entre Gilson Moura e Rychardson, chegando ao
ponto de quase chegarem às vias de fato em frente à TV Ponta Negra, onde
o deputado participa de um programa, e mesmo ameaça de morte, por meio
de um “tiro” de arma de fogo. Diz o magistrado em um dos trechos da
sentença: “Como se observa dos áudios referentes às interceptações das
conversas telefônicas acima, Rychardson é pessoa de temperamento
agressivo, chegando até mesmo a revelar o seu propósito de agredir
fisicamente o deputado estadual Gilson Moura, que, segundo ele, em
relação ao episódio, estava querendo ‘ser santo’, tendo chegado, até
mesmo, a ameaçá-lo de ‘abrir o jogo’ e de dar-lhe um ‘tiro’”, relata o
magistrado.
Num dos diálogos interceptados prela Justiça, Rychardson conversa com
Iberg Paiva de Moura. Nele, Rychardson relata que quase agredia Gilson
em frente à TV Ponta Negra. “Estou engolindo o pão que o diabo amassou
com ele (Gilson). Essa semana me desentendi com ele, botei ele dentro do
carro e fui lá em Acácio. (…) Foi a confusão maior do mundo. (…) Eu
disse: ‘você está, você é um pilantra, covarde, mau caráter. Não dirija
mais a palavra a mim, você, seu picareta’. Ele colocou a mão no meu
ombro, eu dei uma ‘munhecada’ na mão dele que quase tora. Eu disse:
‘nunca mais dirija a palavra a mim, você é um picareta. Isso não é para o
resto da vida não seu imbecil”, revela a sentença.
Noutro trecho do diálogo, Rychardson conta como se deu a despedida da
conversa com Gilson. Segundo Rychardson, ele disse a Gilson: “Eu lhe
conheço, sua picaretagem todinha, que você me usava também para fazer
isso, agora eu não fazia porque tenho postura. Ele disse: ‘Não tudo
bem!’. Eu disse ‘é, tudo bem mesmo. Desça do meu carro’. Aí ele bateu a
porta. Quando ele bateu porta de frente a TV Ponta Negra, eu disse:
‘seja homem de novo de fazer isso no meu carro!’. Aí eu desci e fui para
cima dele. Ai ele disse: ‘espera aí, tenha calma’. Ele se assustou,
entendeu? Aí entrou dentro do carro e disse: ‘rapaz, você ia brigar
comigo?’. Eu disse: ‘não ia brigar o que? Não admito ninguém fazer isso
no meu carro. O que você quer? Bata de novo na porta do meu carro para
ver se a gente sai no murro aqui eu e você’”.
Rychardson acrescenta, ainda conforme o diálogo, que chamou o
deputado de “pilantra” e dono do mundo. “Só porque tem uma porra de um
mandato que pode tratar as pessoas assim? É bom que todo mundo se una e
lhe derrote, que eu não voto em você, eu to lhe dizendo que a partir de
hoje eu não quero conversa com você’”.
Segundo o magistrado, “como se vê, os diálogos acima transcritos são
demonstrações da insatisfação do acusado Rychardson com o então deputado
estadual Gilson Moura e o denunciado Acácio Forte, que agia na
representação dos interesses do mencionado deputado. Como se depreende, o
acusado Rychardson falou dessa discussão e briga com os seus anteriores
aliados, o deputado estadual Gilson Moura e Acácio, por que estava
descontente e desgostoso da forma como estava sendo tratado pelos seus
anteriores parceiros. Por isso, falou abertamente da relação de ligação e
de associação com as pessoas em referência”.
“Diante deste contexto”, conclui o magistrado, “infere-se que o
acusado Rychardson de Macedo teve sim relações próximas e de negócios
com o então deputado estadual Gilson Moura e que o denunciado Acácio
Forte representava os interesses daquele nas parcerias e nos acordos
negociais firmados com o primeiro acusado”, diz o juiz.
do portal JH
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